U2 embala SP com sucessos e atitude política

21 fevereiro, 2006

O primeiro show do U2 em São Paulo durou exatamente duas horas e quinze minutos, e terminou depois do segundo bis, quando os músicos, com nítida relutância, deixaram o palco. A apresentação do grupo irlandês, no estádio do Morumbi, foi marcada por sucessos e pela maneira carismática com que Bono faz música - e também política, não sem um tom populista.
A platéia respondeu com mais que animação: o público visivelmente se deixou levar pelo vocalista irlandês, que cantou With or Whitout ajoelhado e com a cabeça encostada na barriga de uma fã brasileira, que foi convidada ao palco. A morena, cuja identidade ainda era desconhecida no começo da madrugada, encerrou sua participação dando um beijo na boca do músico.
De maneira intensa, porém tentando ser discreto, Bono, que no domingo almoçou com o presidente Lula, fez sua tradicional pregação, ora suportada pelas imagens no telão, ora por discursos dissimulados durante o espetáculo. Lula surgiu duas vezes. A primeira, no telão, fazendo contraponto a Bush, o que provocou um ensaio de vaias. A segunda, no final do espetáculo, quando Bono agradeceu a hospitalidade do presidente do Brasil. Emergiram também trechos da Declaração Universal dos Direitos Humanos (em português) e a frase "global call against poverty" (chamada global contra a pobreza), em compasso com o repertório do grupo irlandês. Bono abriu o show com City of Blinding Lights, seguida de Vertigo. Mas foi na terceira música - Elevation -, quando fez a primeira interação da noite em português, com um "oi, galera", que o público começou a ceder aos irlandeses.
Na seqüência, Until The End of the World e New Year's Day. No final da música, o vocalista fez uma nova tentativa de falar em português, mas foi interrompido pelos gritos de "Brasil, Brasil" do público. Mais uma vez e Bono conseguiu dizer o que queria: "Copa do Mundo, rumo ao hexa. Deus é brasileiro", fazendo as 73 mil pessoas presentes no estádio do Morumbi enlouquecerem.
Após a quinta música, Still Haven't Found What I'm Looking For, Bono puxou o coro "ai, ai, ai...", que foi prontamente respondido pela platéia "está chegando a hora, o dia já vem raiando, meu bem..." (versão nacional para o clássico Cielito Lindo). Depois, Beautiful Day, que fez a área de cadeiras superiores literalmente tremer sob os saltos dos fãs. A banda tocou ainda Stuck In A Moment, Love, Peace or Else e Sunday Bloody Sunday até chegar a outro momento marcante.
O lado engajado de Bono surgiu fortemente diluído no show com a apresentação de Miss Sarajevo, canção originalmente gravada em parceria com o tenor Luciano Pavarotti. Antes de iniciar a música, o vocalista, com venda nos olhos, acendeu um sinalizador. No final, o telão do show exibiu em português cinco artigos da Declaração Universal dos Direitos do Homem. As canções seguintes foram Pride (In the Name of Love) e Where The Streets Have No Name, quando, em mais uma interação com o público, Bono disse "telefone", e a platéia respondeu iluminando o estádio com milhares de aparelhos celulares.
Durante todo o espetáculo, um telão principal, ao fundo da banda, e os menores à direita e à esquerda do palco exibiram imagens simultâneas dos quatro integrantes da banda - o guitarrista The Edge, o baterista Larry Mullen Jr. e o baixista Adam Clayton, além de Bono. One encerrou a apresentação.
A banda voltou ao palco duas vezes, com os sucessos Mysterious Way, All Because You, With or Without, Zoo Station, The Fly e 40. No telão, imagens simulavam um caça-nível e exibiram Lula - que recebeu vaias do público - e do jogador Ronaldo ao lado da taça da Copa do Mundo. Destaque para All Because You, que animou um público nada derrotado pelas quase duas horas de show, e With or Without, quando, de quepe militar e óculos, Bono cantou abraçado a uma fã.
Depois de uma maratona para compra de ingressos e do preço nada convidativo para a maioria (a entrada mais barata custava R$ 200), a platéia que deixou o Morumbi na madrugada desta terça-feira parecia ter se esquecido de todos os contratempos. Na multidão que deixava o estádio, os comentários e as expressões nos rostos pareciam exibir alegria, um sentimento de realização e - porque não - de alívio, por ter assistido a um show que fez história em São Paulo.

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